AGU estuda mudanças nas regras sobre controle acionário da Eletrobras

Escrito por: 17304

Capa da Notícia

27 de fevereiro 2023

Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil  As regras para a privatização da Eletrobras estão hoje em processo de revisão na AGU (Advocacia-Geral da União). A pedido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o órgão jurídico do governo federal iniciou um estudo sobre o caso. Esse trabalho tende a culminar em pedidos à Justiça para reversão de determinados pontos da operação. Lula declarou num café com jornalistas, no último dia 7, que a privatização da Eletrobras foi “leonina contra o governo” e “lesa-pátria”. “Foi feito quase que uma bandidagem para que o governo não volte a adquirir maioria na Eletrobras”, afirmou ele, antes de anunciar o início dos estudos da AGU. Em 19 de janeiro, membros do CNE (Coletivo Nacional dos Eletricitários) já haviam se reunido com o próprio advogado-geral Jorge Messias para tratar do assunto. No encontro, os eletricitários listaram a ele suspeitas de irregularidades na privatização. Ikaro Chaves, diretor da Aesel (Associação dos Engenheiros e Técnicos do Sistema Eletrobras) e ex-membro do governo de transição, afirmou que parte do que foi informado pelos trabalhadores à AGU deve embasar os processos contra a privatização. Tem, mas não controla Chaves afirmou que o primeiro problema apontado pelos eletricitários é que a lei da privatização da Eletrobras, na prática, limitou o poder de voto do governo na empresa num patamar abaixo do controle acionário da União. Antes da privatização da Eletrobras, a União detinha cerca de 63% das ações da empresa. Os votos do governo tinham peso proporcional a essa parcela. Isso significa que ele controlava a empresa. Após a privatização, a participação societária da União na Eletrobras foi reduzida para cerca de 42%. Acontece que, com base na lei sobre a operação, o governo vota como se tivesse só 10% das ações da companhia. Chaves explicou que a lei da privatização limitou a participação de todos os acionistas em votação da Eletrobras para que, teoricamente, nenhum grupo específico – seja ele público ou privado – tivesse controle sobre a empresa. No entanto, hoje, só a União tem mais de 10% das ações da companhia. A lei da privatização, portanto, serviu exclusivamente para “esterilizar” as ações do governo nos processos de votação. "A única prejudicada foi a União. Foi com o objetivo de evitar que o futuro governo assumisse [a empresa]", disse Chaves. Lula, aliás, criticou essa “esterilização” na conversa com jornalistas. Não controla, mas paga Chaves ressaltou que essa mudança no poder de votação desproporcional ao capital da União pode criar uma situação absurda. Ele lembrou que, no caso Americanas, os sócios-controladores da empresa podem ser obrigados a arcar com prejuízos causados pela varejista. No caso da Eletrobras isso também pode acontecer por conta de uma eventual má gestão, principalmente porque a empresa é hoje controlada por indicados dos sócios das Americanas. Chaves explicou que, nessa hipótese, a União teria que assumir 42% das dívidas, já que tem 42% do capital da empresa. Isso, mesmo tendo poder de voto sobre os rumos da companhia de só 10%. "Um princípio básico da sociedade por ações é de que cada ação vale um voto. Você tem que ter os ônus e os bônus", explicou Chaves. "Numa eventual má gestão de uma empresa pública, a União vai ter que arcar com isso. Só que ela não determina o rumo da gestão. Então como é que ela vai arcar com o prejuízo que ela não causou?" Vende, mas não pode comprar Por fim, Chaves lembrou que a privatização da Eletrobras prevê uma espécie de punição para acionistas que atuem para tornar-se sócios majoritários da empresa, isto é, deter mais de 50% das ações. Essa previsão encarece uma possível tentativa de o governo recomprar o controle da companhia. A tal punição é chamada de cláusula de poison pill (pílula de veneno), na sigla em inglês. Por meio dela, se um acionista adquirir na bolsa de valores ações para deter mais de 50% do capital da Eletrobras, ele é obrigado a ofertar aos donos dos outros 49,9% das ações um valor 200% acima do de mercado para compra dos papéis. Segundo cálculos do CNE, por conta desta cláusula, a União teria de pagar R$ 161 bilhões para reaver o controle da Eletrobras. Caso a poison pill e a limitação sobre poder de voto sejam derrubadas, o custo para reestatizar a Eletrobras seria de cerca de R$ 5 bilhões. "Foi como um sequestro", disse Chaves. "Eles sequestraram a empresa e falaram: te devolvo, mas se você quiser pegar ela toda de volta tem que vir pagar o resgate aqui." Lula afirmou que a compra de ações da Eletrobras para retomada da empresa não é prioridade em seu governo. O presidente, contudo, não descartou essa possibilidade. Chaves afirmou que todos os problemas indicados pelo CNE à AGU já são temas de ações judiciais em tramitação. Ele, aliás, disse que há ações que visam o cancelamento de toda a privatização ainda aguardando julgamento. Após as declarações de Lula sobre a privatização, o atual presidente da Eletrobras, Wilson Ferreira Junior, afirmou que a operação foi debatida no Congresso Nacional e aprovada no TCU (Tribunal de Contas da União). Ele informou, em nota encaminhada à revista Veja, que o processo atraiu investimentos e garantirá tarifas de energia módicas. A AGU informou que não informou datas para o fim de seus estudos nem adiantou qual será o resultado deles. Por Vinicius Konchinski, com edição de Rodrigo Durão Coelho/Brasil de Fato