Argentinos vão às ruas nesta quarta (20) em primeiro protesto contra Milei
20 de dezembro 2023
"50 mil pessoas podem marchar pela calçada? Vamos falar sério", ironizou líder do Polo Obrero – Foto: Laura Lescano/Télam
Os argentinos sairão às ruas nesta quarta-feira (20/12) no primeiro protesto de massa contra o governo do presidente ultradireitista Javier Milei. Convocadas pela Unidad Piquetera e pelo Polo Obrero, as manifestações são uma reação ao plano de ajuste econômico que o ministro da Economia, Luis Caputo, anunciou na semana passada. As organizações de esquerda também reagem às ameaças do governo argentino, que promete prender e cortar benefícios sociais dos manifestantes que bloquearem as ruas.
Os organizadores estimam entre 30 e 40 mil participantes no protesto contra Milei. Ao longo do dia, desde a manhã, os manifestantes vão se reunir em tradicionais pontos de encontro na grande Buenos Aires. À tarde, eles se concentram nas imediações do Congresso Nacional. A previsão é que a marcha tenha início às 16h, com destino à Praça de Maio.
Também devem se somar aos protestos setores do movimento operário argentino, como metalúrgicos, gráficos e trabalhadores do setor de telecomunicações. Do mesmo modo, professores reunidos na Ademys (Associação de Docentes de Buenos Aires) prometem marcar presença nos atos. Advogados e ativistas dos direitos humanos pretendem ir aos protestos com o objetivo de evitar detenções ilegais dos manifestantes.
Ameaça de repressão
Na segunda-feira (18), a ministra do Capital Humano da Argentina, Sandra Pettovello, anunciou que vai cortar os benefícios sociais dos manifestantes que realizarem bloqueios. “Só quem não vai receber pelo plano é quem vai à passeata e bloqueia a rua: quem bloqueia não recebe”.
Pettovello afirmou ainda que “quem promover, instigar, organizar ou participar de piquetes perderá todo tipo de diálogo com o Ministério do Capital Humano”.
Anteriormente, a ministra da Segurança Nacional, Patrícia Bullrich, já havia anunciado um agressivo pacote de medidas contra bloqueio de ruas e demais vias públicas no país. Assim, quem fizer “piquetes” que impeçam a circulação total ou parcial poderá ser preso em flagrante. “Sem liberdade não há ordem, e sem ordem não há progresso”, diz o comunicado divulgado à imprensa.
Na ocasião, Bullrich – candidata derrotada à presidência pela coalizão “Juntos por el Cambio”, do ex-presidente Mauricio Macri, sustentou que os protestos seguem “permitidos”, mas deverão ocorrer nas calçadas, e não nas ruas, como fazem tradicionalmente or argentinos.
“Toda pessoa que estiver na calçada não vai ter problema nenhum. Pode se manifestar na calçada. O que não queremos são bloqueios de ruas, de rotas”, disse a ministra, que também ocupou a pasta da Segurança durante o governo macrista.
“Impossível marchar na calçada”
Os piquetes desta quarta-feira marcam o 22º aniversário das revoltas populares de 20 de dezembro de 2001 – conhecido como “estallido social” – que culminaram com a renúncia do então presidente Fernando de la Rúa.
Diante das ameaças do governo Milei, eleito em nome da suposta defesa da liberdade, a Unidad Piquetera reagiu reforçando a convocatória para as manifestações. “Não vão passar com esta política de achatamento dos direitos dos trabalhadores. Vamos todos às ruas”, afirmou a organização, em comunicado.
Em entrevista coletiva nesta segunda (18), o líder do Polo Obrero Eduardo “Chiquito” Belliboni classificou as determinações das ministras de Milei como “ameaças”. Nesse sentido, disse que elas atacam o direito de manifestação previsto na Constituição argentina. Previu que haverá “muitíssima gente” amanhã, e ironizou. “50 mil pessoas podem marchar pela calçada? Vamos falar sério, é impossível marchar pela calçada”.
Ao jornal Clarín, Belliboni investiu contra o ajuste econômico do governo. “O processo inflacionário está destruindo os salários, enquanto não há nenhuma medida de compensação. Em poucos meses, os programas sociais vão deixar de ter poder de compra e os restaurantes comunitários estão vazios, porque não entregam comida.
Por outro lado, ao portal Infoabae, o líder do Polo Obrero voltou a carga contra as ameaças de repressão aos protestos. “Houve uma mudança de governo, não de regime político”, frisou.
Plano Motosserra sangra os argentinos
De acordo com o Indec (Instituto Nacional de Estatística e Censos), 401,% dos argentinos estavam na pobreza durante o primeiro semestre deste ano. Além disso, um em cada dois habitantes do país recebe algum tipo de assistência estatal, de forma direta ou indireta, de acordo com o Observatório Social da Universidade Católica Argentina.
Mesmo diante desse cenário, em 1º de janeiro, o governo Milei começa a retirar os subsídios estatais aos transportes e serviços públicos (eletricidade, água e gás), conforme havia anunciado o ministro Caputo. Os cortes de subsídios, somado a uma desvalorização do peso argentino, vem tendo impacto inclusive no preço dos alimentos. O objetivo do governo é reduzir em 5% os custos do estado.
Em novembro, segundo o Idec, a inflação na Argentina ficou em 12,8%. No acumulado em 12 meses, esse índice alcançou 160,9%. Na semana passada, o jornalista Leandro Demori postou relato de um amigo estimando os impactos na vida dor argentinos do plano de ajuste de Milei, que deve turbinar ainda mais os preços no país.
Lula mostra outro caminho
Diante do arrocho promovido por Milei, o advogado e assessor parlamentar Matías Gayol publicou um vídeo elogiando as medidas adotadas, no Brasil, pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que vão na contramão do receituário que apregoa o líder ultradireitista argentino.
Nesse sentido, ele cita especificamente a taxação dos super-ricos, proposta do governo Lula aprovada pelo Congresso e sancionada na semana passada, como forma de ampliar a arrecadação, garantindo ao mesmo tempo a ampliação de políticas públicas. “É assim que se resolvem os problemas econômicos”, elogiou Gayol.
“A (proposta) de Milei é o contrário: beneficiar os monopólios capitalistas que se enchem de grana às custas dos trabalhadores. E o mais importante de tudo, fazendo isso (Milei) não vai resolver nenhum problema econômico”, afirmou. Para o assessor, o ajuste do governo argentino vai causar “muitíssimo mais” inflação.
“Milei quer te convencer que isso seria uma espécie de sacrifício útil e inevitável para amanhã poder melhorar. Mentira… é o que te dizem todos os governos de direita para te enganar. Não há luz no final do túnel. Isso só vai gerar uma brutal transferência de renda dos trabalhadores aos monopólios capitalistas. Lula em Brasil demonstra que existe um caminho muito diferente para sair da crise econômica”.
Por Tiago Pereira/Rede Brasil Atual